quarta-feira, 15 de maio de 2013

PESSOAS QUE SE FAZEM DE VITIMA


Aposto que todo mundo já se deparou com uma pessoa que se coloca como a injustiçada do mundo. Se ainda não, há possibilidade de você ser essa pessoa. Reclamar, lamentar, lastimar se torna tão habitual a pessoas que se enxergam como vítimas do universo, que quem convive junto a estas nem leva em consideração mais suas lamúrias. Afinal, o ocorrer de eventuais adversidades desperta a solidariedade dos colegas, amigos, familiares, mas quem transforma tudo em adversidade só angaria descrédito.
 As pessoas só têm defeitos, nenhum trabalho é bom, nenhuma amizade é verdadeira, nenhuma atividade é agradável, ninguém é admirável, nada dá certo, nada está legal, tudo é difícil, desprazeroso, chato, problemático, estressante, relatos contínuos de doenças, dores, sofrimento, infortúnios são comuns, enfim, encontrar motivos pra reclamar de tudo e de todos é um comportamento nítido de quem tem o mundo como inimigo. Estas pessoas constroem histórias tão convictas, que passam a acreditar que realmente são coitadinhas e os outros, carrascos. Muitas vezes chegando a convencer alguém disso.
Se posicionando como vítima, além de desviar a culpa de si mesmo acerca das mazelas da qual reclama, existe a possibilidade de culpar um outro ser por tudo aquilo que se está passando. É tão mais fácil culpar o funcionário e atribuir a ele erros do que assumir as próprias falhas enquanto chefe; é tão conveniente culpar o outro por não nos amar à assumir as atitudes nada amáveis que adotamos diante destas pessoas; é tão cômodo julgar os alunos em vez de perceber a própria falha enquanto professor; é tão mais confortável apontar os marginais na rua do que assumir nossa própria contribuição para a marginalidade; é simples culpar os colegas, a secretária, o motorista ao lado, o filho, os parentes por inúmeras coisas que não são muito agradáveis, mas que tem nossa parcela de culpa, ou total culpa por ter ocorrido. Tudo que eclode em nossa vida está sob nossa responsabilidade. Se vitimizar é uma tentativa de fugir desta.
O ponto mantenedor do comportamento vitimizado é que este furta a atenção e misericórdia de alguém que, mesmo que por pouco tempo, despende energia psíquica acreditando que a pessoa realmente foi injustiçada por alguém ou algo. Mesmo isso não sendo a verdade plena, ser vítima implica em um aglomerado de ganhos secundários, além da atenção das pessoas: o apoio, o amparo, a solidariedade, a disposição em lhe ajudar, enfim, muitas coisas satisfatórias. Se não existissem vantagens, o comportamento não seria mantido.
Conviver com gente que se acostumou a ser ‘pobre coitada’ não é algo muito fácil, porque qualquer tentativa que tenhamos de lançar um olhar mais positivo para animá-la, confortá-la ou incentivo a ela sair deste movimento passivo de derrota logo é bombardeado pelas justificações das desgraças vividas. Concordar que a vida da pessoa é uma desgraceira mesmo é uma alternativa válida quando se cansa de vê-la tentando convencer de que é digna de pena. Afinal, chantagem emocional só comove o próprio chantagista, geralmente causa irritação no ouvinte.
Quem consegue identificar em si mesmo esta característica já está em vantagem, pois não é algo fácil assumir os próprios pontos negativos. Se perceber é o primeiro passo em direção à mudança. A frase Lacaniana ‘Qual a tua contribuição na desordem da qual te queixas?’ é importante de ser lembrada continuamente diante das vicissitudes da vida.
As pessoas só colhem aquilo que plantam. Cada pensamento, ação, palavra que lançarmos ao mundo é uma semente que, querendo ou não, vai germinar e implicar em resultados. É má-fé ficar culpando aos outros, culpar o mundo, culpar o destino e se fazer de vítima. A culpa pelo que escolhemos projetar no mundo nunca é do outro, é só nossa. Cada um só é vítima de si mesmo. Quem não gosta do que está recebendo do “destino” deve refletir sobre o que fez lá no passado para estar hoje nesta situação... Sem se fazer de coitadinho, porque isso é desprezível. A vida é apenas consequência do que fazemos ou que deixamos de fazer, ou seja, resultado de nossas escolhas pessoais.
Psicóloga katree Zuanazzi
CRP 08/170170

Publicado no Jornal de Notícias "A Folha de Saltinho" dia 11-05-2013
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