Autoestima baixa é o ponto principal
enfrentado pelas mulheres que tem dificuldade no relacionamento amoroso. Independente
de manterem-se casadas ou separarem, vivenciar um relacionamento conturbado sempre
implicara num abalo da imagem formatada acerca de si mesma, principalmente
quando se cede ao outro o poder acerca de quem se é.
Mesmo insatisfeita com o relacionamento
que vivem algumas mulheres se colocam na obrigação de se objetificar para
reparar os danos deste, contaminadas pelo viés da cultura e das imposições
perpetradas ao feminino ao longo da história que se repercute até hoje. A
educação intransigente a qual fomos submetidas nos implantou a ideia de que a
mulher para ter um relacionamento feliz, idealizado pelos famosos contos de
fadas, precisa ser vulnerável ao companheiro, lhe servir, fazer-lhe as vontades
em detrimento das próprias, ignorar as necessidades subjetivas para satisfazer
os desejos do homem, ou seja, ser submissa. Assim, a mulher continua se
esforçando inconscientemente pra ser o capacho a qual foi adestrada a ser, sem
se dar conta que isto não é algo saudável e jamais vai resultar num bom
relacionamento amoroso. Isto só promove uma relação de desamor e desprezo. Desamor
no sentido de que ninguém no mundo sente amor por quem não se ama, e desprezo é a reação natural de um ser humano diante de quem não se respeita. Quem se
coloca como um objeto para o outro se autossabota.
Numa matéria exibida recentemente
pelo programa Fantástico da rede Globo de televisão, se retratava um viés de como
seria o mundo sem as mulheres. Neste, as mulheres iam viajar e os afazeres
domésticos deveriam ser feitos pelos homens que, devido a isto, sentiriam falta
extrema da companheira, deixando assim a entender que o homem sente a falta da
mulher para cuidar da casa e não pelo sentimento que tem por ela. Então estas
mulheres são meras domésticas destes homens? Então a única forma de amor que
tem é pelo serviço que presta ao marido? É saudável e sincero um amor assim? Quem
tem sentimentos verdadeiros por outra pessoa sente falta da pessoa por quem ela
é, não da louça que ela lavava, da comida que ela fazia, do chão que ela
esfregava, do jeito que ela cuidava do filho... Não foram lisonjeiras para com
a classe feminina as colocações impressas pelo Fantástico, mesmo sendo colocado
de uma forma “bonitinha”.
Ser doméstica do marido não é ônus apenas
daquela mulher coitadinha, sem estudo, que não teve incentivo para progredir na
vida. Existem muitas mulheres que teriam tudo para serem “poderosas”, que são
donas de si, evoluídas, estudadas, inteligentes e bem sucedidas, que reproduzem a
mesma ação de empregada do companheiro sem se dar conta disso. Tem casal que
ambos trabalham o dia todo e quando chegam em casa ao final do dia, ainda é a
mulher que vai limpar a casa, fazer o jantar, cuidar do filho e assim por
diante, enquanto o “donzelo” toma seu banho e vai pro sofá assistir televisão. E
o pior é que é visto com tanta normalidade...
Percebo no exemplo de mulheres que vivem
como um objeto para o marido e depois não sabem por que foram abandonadas,
traídas... (não estou justificando traição, apenas lançando olhar sobre outro
ângulo). E aquele bordão “eu fazia de tudo, era uma boa esposa, vivia pra ele,
etc. e tal” é o mais ouvido. Ficam inferindo ao parceiro a ideia de monstro e
se colocando como vítima, sem perceber o quanto contribuíram para a decadência
do relacionamento. Lacan indaga “qual é a tua contribuição para a desordem da qual
te queixa?”. Culpar o outro é fácil, mas só consegue dar a volta por cima quem
se tira da posição de vítima, olha para si mesmo de uma maneira sincera e se
reposiciona no mundo de uma maneira mais assertiva. Lembrando que as pessoas
só fazem com a gente o que lhes permitimos fazer. E o principal: antes de uma
pessoa trair outra, geralmente esta já se traiu primeiro. Você se colocar como
um objeto para uma pessoa é a mais profunda forma de traição consigo mesma.
Existem mulheres que não fazem nada, absolutamente
nada por si, que não tem um momento se quer para pensar e cuidar de si mesma e
depois não entendem porque deixaram de ser interessantes. Autoestima é uma
construção cotidiana e as pessoas mais amadas são as que mais se amam. Quem não
gosta e cuida de si mesma dificilmente receberá isso do mundo externo. O amor
começa com o amor próprio.
Cuidar da mente e do corpo, aprender
algo novo, uma língua, uma dança, um ofício, fazer academia, terapia, cursos,
participar de eventos, lazeres enfim, fazer uma atividade prazerosa, inovar, se
lançar a novas possibilidades, é de extrema importância para fomentar o amor
próprio. Investir em si mesma é a atitude mais sábia a se tomar, já somos o nosso
maior patrimônio. Relacionamentos começam e terminam, mas nosso relacionamento
conosco mesmo é eterno.
Psicóloga katree Zuanazzi
CRP 08/170170
Publicado no Jornal de Notícias "A Folha de Saltinho" dia 13-04-2013Pode ser reproduzido citando a fonte e a autora. (Lei 9.610/1998)