sábado, 8 de dezembro de 2012

SÍNDROME DE OTELO: QUANDO O CIÚME É DOENTIO


Sentimento avassalador que nos alcança em momentos mais inusitados e inesperados. Desde uma leve brisa de necessidade de proteger nossa “propriedade”, até fúrias impetuosas em relação à mesma. Ínfima, razoável ou exacerbadamente, com ou sem motivos concretos, não há quem não tenha experienciado de alguma maneira o desconforto do ciúme.  
      É uma emoção natural e inevitável, quando se trata de alguém que se ama, no entanto, pode apresentar-se de maneira patológica dependendo da forma que se manifesta. Ou seja, sentir o ciúme é normal, o que, muitas vezes, se torna patológico são as atitudes tomadas em relação ao ciúme sentido.
   A nomenclatura Síndrome de Otelo é baseada na peça “Otelo” que Shakespeare escreveu em 1603. A trama base da história se da com Otelo (Capitão mercenário), recentemente casado com Desdêmona, que é convencido por seu subordinado Iago (soldado que aspira promoção), por motivos torpes e vingança, de que sua esposa lhe é infiel. Impulsionado pela fúria da suposta traição, Otelo assassina sua esposa e logo recebe a notícia de que tudo não passava de uma conspiração, que Desdêmona, na verdade, sempre lhe fora fiel. Mas já era tarde demais, sua esposa jazia ao chão. A Síndrome de Otelo então refere-se ao ciúme infundado e hostil, ou melhor, doentio.
     Hoje em dia, não são tantas as incidências de ciúmes que tenham chegado a este ponto. Mas existem! Algumas relatadas na mídia, outras não. A questão é que, independente de atos incitados por ciúmes provocarem morte física ou não, eles (os atos) sempre representarão algum tipo de morte na relação: morte do respeito, dos sonhos, dos projetos, da confiança, da consideração, da imagem bela que se tem sobre a pessoa amada e até mesmo a morte do amor. Alguém que tenha um companheiro que explode constantemente por ciúmes, dificilmente vai conseguir admirá-lo por muito tempo, e só se ama quem se admira.
     O “sentir” ciúme é saudável, é sinal de que se importa com a pessoa, mas quando ele começa a representar algum tipo de violência entre o casal, ou seja, começa a manifestar-se por atos, é sinal de que as coisas não estão bem. Lembrando que violência não é apenas física, que seria espancar o companheiro, mas também a psicológica, que é a que mais ocorre, no entanto mascaradamente. Xingar, gritar, insultar, insinuar que o companheiro é infiel (sem motivos concretos), vigiar excessivamente, controlar a vida do parceiro, destratar, ameaçar, manipular, impedir que este tenha vida social, fazer pressão, impor proibições, e até mesmo se fazer de vitima (o ciumento acredita que é vítima) são exemplos de violência psicológica.
      Uma pessoa que seja submetida a este tipo de tratamento violento começa a ter uma inversão de sentimento em relação ao companheiro. Se antes (dos surtos de ciúmes) gostava de estar junto, sentia-se seguro, confortável, feliz com o relacionamento, passa gradativamente a sentir-se insatisfeito. O sentimento tão belo que ostentava vai aos poucos se dissipando e dando espaço a sentimentos negativos e emergem então pensamentos de que talvez, sem essa pessoa ciumenta do lado, a vida seria melhor. É neste ponto que a ideia de divórcio começa a ecoar na mente, como a única alternativa de se livrar daquela angústia toda que vem sofrendo.
     Ao mesmo tempo, a própria pessoa que é a ciumenta sofre demasiadamente também. Primeiro, ela acredita fielmente estar sendo traída, mesmo sem ter provas reais (enfatizo que estou me referindo a pessoas ciumentas sem terem sido traídas no relacionamento atual) e, qualquer eventualidade, por mais banal, já remete a ideia de uma suposta traição. Às vezes, por ter vivenciado traições em outros relacionamentos, ou então, pela simples fantasia de estar perdendo o companheiro já fica irado e toma atitudes impensadas e coléricas.
    Grande parte dos divórcios foi motivada por ciúmes infundados causadores de contendas. Se um relacionamento chegou a este ponto já está mais do que na hora de sentar, conversar sobre o assunto, propor meios que viabilizem uma resolução do conflito e, se necessário, solicitar a ajuda de um profissional para tanto. Ninguém aguenta muito tempo viver com este sofrimento sem ter a saúde afetada.
Psicóloga Katree Zuanazzi
CRP 08/17070

Publicado no Jornal de Notícias "A Folha de Saltinho" dia 24-11-2012
Pode ser reproduzido citando a fonte e a autora. (Lei 9.610/1998)

Nenhum comentário:

Postar um comentário